[ENTREVISTA] ESC Portugal à conversa com Wanda Stuart (Parte II)

(continuação)

ESC Portugal: Ainda relativamente ao seu tema, o que é que podemos esperar do minuto e meio que está por revelar?

Wanda Stuart: Bem, a canção não é uma canção difícil para se ouvir. Para quem experimentar cantar não é assim tão fácil, parece fácil porque é uma melodia que não é muito elaborada, não tem informação, digamos assim. É uma melodia simples, sem ser simplista, que eu não gosto de coisas simplórias, nem simplistas, nem fáceis, mas é simples, fica bem no ouvido. Cantar é difícil porque se tem que controlar muito a respiração, eu quando acabo de a cantar fico cansada, mas é uma canção que permite a entrada de quem esteja a ouvir, ou seja, quem esteja a ouvir ouve a primeira vez o refrão e á segunda vez já está a cantá-lo, se quiser. Às vezes é nisso que eu acho que pecam algumas canções que vão a concurso, são tão complicadas, querem mostrar tanta coisa que acaba por se perder o fio condutor. Eu gosto mais de cantar coisas mais simples que permitam que as pessoas que estão a ouvir participem comigo. E se esta canção for escolhida para representar Portugal, será a canção dos portugueses, não a minha canção. As pessoas às vezes esquecem-se um pouco do espírito do Festival RTP da Canção. É a única coisa que o diferencia do Ídolos e de outros concurso semelhantes – para além da história que já tem, e que está associada o mais possível à RTP – é que este Festival serve para divulgar canções, não cantores. Os cantores se se quiserem mostrar têm outros formatos e vão cantar canções que já fizeram sucesso. Aqui o que vai a concurso são as canções. Obviamente os cantores, depois, estão associados a elas. Este é o Festival RTP da Canção, não é o Festival RTP dos Cantores. Eu fiquei muito contente quando vi que tinha sido seleccionada, mas não foi tanto por mim, porque eu vou muitas vezes à televisão, não preciso do Festival para aparecer. O Festival serve para divulgar canções, novos autores que não têm outra janela de oportunidade para mostrar o seu trabalho. Nós os cantores, alguns mais consagrados, somos o instrumento deles, é assim que eu me considero.

ESC Portugal: Pegando no que estava a dizer, o Festival já teve noutros anos uma dimensão diferente…

Wanda Stuart:Gigantesca! Fazia parar o país. Nas semanas antes nós já andávamos a falar de que é que iria ganhar.

ESC Portugal: Hoje é dia não é assim, embora nos últimos anos tenha vindo a renovar-se o interesse.

Wanda Stuart:É natural, porque a televisão está muito democratizada, hoje em dia qualquer pessoa vai à televisão, hoje em dia qualquer pessoa, de um dia para o outro vira famosa, e muitas vezes a fama não tem a ver com o talento. Antigamente não havia isso. Antigamente era difícil aparecer, tinha que se ter uma carreira já construída, ou às vezes o apoio de alguém já consagrado, era assim, fizeram isso por mim, e eu também o fiz por outras pessoas. Hoje em dia basta uma pessoa inscrever-se num concurso e vai à televisão. Já é muito mais banal ser artista, ser cantor. Já não há aquela expectativa por saber quem é que vai ganhar o Festival, quem é que nos vai representar lá fora. Aliás era o único certame que havia durante um ano inteiro. As pessoas viviam muito aquilo, e canções passavam na rádio e as pessoas cantavam-nas passado imenso tempo. Infelizmente hoje já não mas, pronto, as coisas têm a dimensão que têm, têm o seu tempo. Felizmente, e graças à RTP não se acabou com o Festival e também, desde há dois ou três anos para cá tem havido mais algum interesse da malta mais nova e isso é bom. Mas é mesmo assim, nós somos um animal de hábitos e de modas. Agora há a febre dos Ídolos, mas isso há de passar, daqui a uns tempos vem um qualquer outro concurso, e é mesmo assim.

ESC Portugal: E o que é que nos pode revelar sobre o que está a ser preparado para a sua actuação no palco do Festival?

Wanda Stuart: Bem, eu não vou revelar nada, para já porque as coisas… se fosse um espectáculo só meu, eu já tinha tudo definido. Mas não é o caso. Algumas das ideias que transmiti à RTP não são possíveis de se realizar, porque antes de mim há uma actuação, depois de mim há outra, e eu compreendo isso perfeitamente. Portanto estamos a tentar encontrar uma solução para ir de encontro às minhas ideias e àquilo que se pode concretizar no palco, com a condicionante de só termos um minuto para a preparação do palco. Eu gostaria muito de criar coisas fantásticas, que deixassem as pessoas surpreendidas, e sei que é isso que estão à espera de mim, mas não sei se as vou conseguir fazer. Mas depois, nos meus espectáculos, vou continuar a cantar esta canção, quer ela ganhe, quer ela não ganhe, porque gosto mesmo da minha canção, e aí provavelmente farei no palco aquilo que criei, na minha cabeça, para ela.

ESC Portugal: Mas pelo menos um coro vai ter, imagino…

Wanda Stuart: Bem… sim… um coro, vou ter, sim, evidentemente. Não vou estar sozinha. É o que posso dizer para já.

ESC Portugal: Muito bem. E como é que tem acompanhado a recepção, pelo público, da sua canção? Tem acompanhado os comentários nas redes sociais, por exemplo?

Wanda Stuart: Olha, só para verem que eu não percebo muito disto, eu nem consegui votar em mim! Achei aquilo tão confuso que à primeira tentativa desisti. Eu só há muito pouco tempo é que aderi a essas novas formas de comunicação, digamos assim, e nunca liguei muito a computadores mas por força da necessidade acabei por aderir. Mas sim, acompanhei algumas coisas, alguns comentários. Achei que alguns comentários não foram justos, como por exemplo as acusações de favoritismo. Garanto desde já que isso não aconteceu. Eu não gosto de ultrapassar obstáculos com batota. Odeio batota! Retira o gosto pelos desafios. Mas pronto, eu compreendo, talvez por eu ser uma das pessoas mais conhecidas… algumas pessoas, talvez por força de quererem que os seus ídolos passassem deixaram algumas mensagens menos simpáticas e pondo em causa a credibilidade da votação, e isso não admito, isso é feio. Todas as pessoas tiveram a oportunidade de votar da maneira que entendessem em qualquer dos concorrentes.

ESC Portugal: E o que é que pensa do processo de selecção online e da divulgação de apenas minuto e meio de cada canção?

Wanda Stuart: Relativamente à votação online só tenho uma coisa a dizer, que é o facto de ser pouco abrangente. Toda a gente sabe que temos uma população envelhecida e há muitas pessoas que nunca na vida ligaram um computador. Acho que devia ser uma votação mais aberta, não ser só online. Mas é uma solução como outra qualquer, de alguma forma teria que ser feita, portanto foi uma opção. Tenho pena, realmente, é que só tenham publicado um minuto e meio das canções porque, - se bem que dá para termos uma noção do que é que vem a seguir, - o que vem a seguir até pode ser uma coisa completamente diferente, ou pode ser uma surpresa. Não quero dizer que seja o nosso caso. A nossa canção tem um crescendo, mas segue uma linha, não chega ao fim do minuto e meio e transformar-se noutra música, não é? E depois uma canção vale pelo seu todo. Nós quando compramos um disco, não compramos só metade. Acho que não faz sentido; se vão colocar a canção sujeita a votação, então deixem as pessoas ouvir tudo.

ESC Portugal: E já ouviu as outras canções a concurso?

Wanda Stuart: Ouvi, claro! Até por curiosidade. Não vou agora fingir que não quero nem saber… claro, fui ouvir.

ESC Portugal: E o que acha da qualidade, em termos gerais?

Wanda Stuart: Em termos gerais acho que estamos muito bem, temos um bom Festival. Acho que temos ali de tudo, desde a música mais para o cómico, dos Homens da Luta, - que a minha filha gosta muito, acha o máximo. Claro, tem cinco anos, gosta dessas maluquices, - temos também bonitas baladas, temos boas vozes, bons temas e acho que as pessoas vão ter um leque variado para poderem escolher consoante o seu gosto pessoal.

ESC Portugal: E o que é que a sua canção tem que faz dela uma potencial vencedora, quer em Portugal, quer na Eurovisão?

Wanda Stuart: Bem, não vamos ser cínicos ao ponto de achar que vamos ganhar lá fora. Portugal não tem força para isso, o país em si… nós não somos assim tão necessários na Europa que eles nos dêem esse voto de confiança. E depois é natural que países maiores, mais fortes tenham muito mais condições para ganhar. Portanto o que eu quero é que a nossa prestação, se formos à Eurovisão, seja o mais digna possível e que as pessoas pensem que, mesmo não ganhando, mandamos sempre bons intérpretes, bons números… a Vânia Fernandes, para mim, foi das melhores que já mandámos lá fora. Aquela miúda pôs-me a chorar! Eu emocionei-me bastante com ela e arrepiei-me, porque é uma boa voz, é uma miúda que, apesar de gordinha, usa a figura dela com power… sou fan dela, gosto muito dela, e acho que ela fez uma prestação maravilhosa, muito bonita, e realmente, quando toda a gente pensava, lá fora, o público, e alguns críticos, que tínhamos fortes hipóteses não de ganhar, mas pelo menos de ficar nos lugares cimeiros, fomos por ali abaixo. Porquê? É por isso mesmo. Não é tanto as politiquices… há politiquices, claro que há! Há interesses que estarão nos bastidores, com certeza. Não sei quais são, também não quero saber, mas há esse factor. Nós somos um país pequeno, não temos tanto poder como tem uma Rússia, por exemplo. Por isso aquilo que eu exijo a mim própria, não só no Festival da Canção, em Portugal, com, se se der o caso de eu ir ao Festival da Eurovisão, - e acreditem que sou a pessoa mais exigente comigo própria, - é ir para cima do palco e dar o meu melhor. A minha canção, o que ela tem, que possa representar bem Portugal, é uma melodia forte, com garra, com poder, que vai ser interpretada por uma pessoa que se entrega, que já tem experiência de palco, que chega ao palco e, apesar de estar tão nervosa, ou mais que os outros, já tem uma bagagem que lhe permite dar a volta a esses nervos, e o conjunto da canção e intérprete acho que tem força para termos uma boa prestação. Eu sei que os portugueses gostam de mim, - como gostam de outros concorrentes, - sei que vão continuar a gostar de mim, vão continuar a respeitar o meu trabalho, quer eu ganhe, quer não ganhe. É isso que peço às pessoas e que espero que compreendam, para mim isto é mais um trabalho que vou fazer. Claro que me vou entregar, como me entrego em qualquer outro trabalho em que me empenhe. E depois ainda a maneira como a vamos apresentar em palco que, volto a frisar, não é exactamente como eu gostaria, mas havemos de arranjar maneira, porque eu sou a mulher que arranja sempre solução para tudo!

ESC Portugal: E dos outros países que já seleccionaram as suas canções, já teve a oportunidade de ouvir alguma coisa?

Wanda Stuart: Ainda não, nem por isso. Ouvi uma, da Noruega, acho… bem, é uma canção alegre, ela é gira, não me parece que tenha assim muita garra no palco… já ouvi melhor… e mesmo entre as nossas canções acho que há melhores, portanto não é uma canção que me meta medo.

ESC Portugal: Enquanto artista, enquanto profissional da música, acha que há uma fórmula? Há um segredo para criar uma canção vencedora?

Wanda Stuart: Não, não há. Desenganem-se. Isso eu vejo através de grandes artistas, mesmo fora do Festival, grandes artistas em todo o mundo, e é engraçado constatar, às vezes aquele tema a que não se dá tanta importância, que pensamos que vai ser o lado B – antigamente nos discos havia o lado B, que era o menos comercial, e havia o lado A, que era o mais promovido, - e às vezes o maior sucesso era o lado B. E quando, às vezes, os compositores pensam em criar uma fórmula, construir uma canção para ser um sucesso, acaba por não resultar e a música não pega. Portanto acho que na arte, e na música em particular, apesar de ser já quase só um negócio, quase uma ciência exacta, o público ainda consegue surpreender os produtores. Porque o público é que decide tudo. Pode-se tentar construir a canção de forma a que fique mais no ouvido ou que seja mais fácil, mais acessível, mas nada é definitivo, nada é garantido. O público é que manda.

ESC Portugal: Vamos terminar, então, com uma última pergunta. Maldita Cocaína, Grande Noite, Cabaret, de Afonso Henriques a Mário Soares, a Música no coração, os seus próprios espectáculos, que produz e interpreta, tem um disco, chamado Animais Nocturnos, um espectáculo de comemoração de 26 anos de carreira, no Tivoli, mais recentemente a Piaf, casou, foi mãe… é uma carreira e uma vida cheia…

Wanda Stuart: Muito cheia! Eu já dei por mim a pensar… eu já cheguei a estrear três espectáculos num ano! Quem é que faz isso? Só uma pessoa maluca! Mas eu gosto de criar espectáculos diferentes, e é muito bom poder fazer as coisas à minha maneira, como eu as imagino. De facto eu já tenho uma carreira… acho que às vezes num ano consigo viver dez anos, porque entrego-me muito às pessoas e àquilo que faço, porque gosto de fazer coisas diferentes, gosto de estar sempre a renovar e a reinventar-me. E dai o conseguir multiplicar-me e conseguir fazer várias coisas num ano, que outras pessoas fazem em quatro ou cinco. E tenho de facto uma carreira recheada. São vinte e oito anos que a mim, às vezes, parecem quarenta. Mas é realmente porque tenho uma capacidade de trabalho muito grande, tenho uma memória que foi treinada para isso, por enquanto o meu corpo ainda me permite fazer esse tipo de loucuras, - saudáveis, mas são loucuras… E há uma coisa pela qual eu sempre me pautei, apesar de em Portugal ser difícil construir uma carreira coerente, porque nem sempre há trabalho para se aceitar só determinado tipo de coisas, eu sempre procurei pautar-me pela qualidade. O meu barómetro é ser coerente comigo própria, é pensar se aceitar este trabalho, daqui a uns anos vou olhar para trás e ter vergonha do que fiz? Então não aceito. Não tem nada a ver com dinheiro, embora também tenha importância, e hoje em dia mais do que nunca, ainda para mais com uma filha para criar, mas é essencialmente uma carreira construída com trabalho, com muito trabalho, com muita entrega e com muita dignidade e respeito pelo que faço.

ESC Portugal: Ao fim destes vinte e oito anos tão ricos, o que é que ainda lhe falta fazer? Tem algum grande sonho por realizar?

Wanda Stuart: Tudo! Tenho muita coisa ainda para fazer, porque graças a deus não me faltam ideias e sou capaz de estar a ensaiar três ou quatro coisas ao mesmo tempo e há muita coisa ainda que eu quero fazer. Por exemplo, nunca fiz cinema em Portugal, e tenho muita pena de nunca ter feito, mas penso que é porque ainda não surgiu a oportunidade, até porque há pouco cinema em Portugal, já vai começando a haver mais, e há bons trabalhos, mas é uma coisa difícil de fazer em Portugal. E depois acho que as coisas acontecem quando têm que acontecer. E, por exemplo, se eu só este ano é que pude ir ao Festival é porque só tinha que ir este ano. Se ganhar, ou não, logo se vê. A minha idade já me permite não estar ansiosa a esse nível, já vou para as coisas com uma calma – aparente! – que me permite aceitar as coisas de outra forma, e não tão ansiosa. Já tive essa fase, quando comecei; agora já tenho os pés mais na terra.

ESC Portugal: E tem algum projecto na calha?

Wanda Stuart: Tenho, tenho, claro! Tenho, mas não posso falar nele. Depois do Festival… Eu tenho que organizar as coisas de forma a não me atropelar a mim própria e como é muita coisa. Neste momento estou a preparar um trabalho discográfico, estou a faze-lo paralelamente ao Festival da Canção, mas não está relacionado com o Festival. É uma coisa para sair muito em breve e que vai surpreender muita gente. Vão gostar, eu acho que vão gostar. As pessoas bem dispostas vão gostar.

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